Empresas tentam reduzir tributação sobre investimentos financeiros

Empresas tentam reduzir tributação sobre investimentos financeirosVárias empresas foram à Justiça para afastar a cobrança de Imposto de Renda (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre a inflação embutida nos rendimentos de investimentos financeiros. O que incentivou companhias como Ambev, Mosaic Fertilizantes, Multilaser, CVC Brasil e Drogasil foram precedentes favoráveis do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na Justiça Federal de São Paulo, porém, dois pedidos foram negados.

Existem contribuintes – entre eles a Marcopolo – que conseguiram decisão final favorável no STJ (não cabe mais recurso) e já se beneficiam da carga tributária menor. Contudo, para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), o STJ está misturando assuntos diferentes nos precedentes.

Nas ações judiciais, as companhias pedem que a inflação seja descontada do rendimento. Argumentam que a inflação não é acréscimo patrimonial, mas mera recomposição e, por isso, não deveria ser tributada.

O argumento foi apresentado pela Mosaic Fertilizantes em mandado de segurança proposto em dezembro de 2019. Na ação, alega que a aplicação da correção monetária preserva o poder de compra, não constituindo efetivo ganho de capital. A liminar, porém, foi negada pelo juiz Paulo Cezar Duran, da 26ª Vara Cível Federal de São Paulo (processo nº 5026317-94.2019.4.03.6100).

O mesmo posicionamento foi adotado pelo juiz Hong Kou Hen, da 8ª Vara Cível Federal de São Paulo, que analisou pedido da Multilaser Industrial. A empresa já recorreu à segunda instância (processo nº 5003415-50.2019.4.03.6100). Na decisão, o magistrado afirma que, apesar dos precedentes do STJ apresentados na ação e da “aparente plausibilidade da tese (não incidência do IRPJ e da CSLL sobre receitas inflacionárias)”, entende de forma diferente, com base nos princípios da estrita legalidade tributária e da literalidade.

Na decisão, afirma que a exclusão da inflação viola o princípio da estrita legalidade tributária por menosprezar a vontade da lei. Além disso, interfere no mercado financeiro ao destacar, compulsoriamente, dos rendimentos das aplicações financeiras de renda fixa e variável, a parcela relativa à inflação. “É cediço que tais rendimentos utilizam índices que são apurados exclusivamente pela valorização ou desvalorização de quotas de fundos, títulos, debêntures, ações.”

Entre os precedentes citados pelas empresas nos processos está o da Marcopolo (REsp 1574231/RS). Na decisão monocrática, a ministra Regina Helena Costa citou como jurisprudência da Corte a orientação de que a parcela correspondente à inflação (lucro inflacionário) dos rendimentos de aplicações financeiras não se expõe à incidência do IR e CSLL.

Para a PGFN, porém, a decisão equiparou dois temas diferentes: a correção monetária sobre aplicações e o “lucro inflacionário”. “A argumentação das empresas ressuscita, por vias transversas, a correção monetária de demonstrações financeiras, mas apenas na parte que lhes aproveita, a das receitas de aplicações financeiras”, afirmou, por meio de nota, o procurador José Péricles Pereira de Sousa.

Ainda segundo o procurador, está vigente no Brasil o princípio do nominalismo da moeda, de modo que tudo aquilo que acresce ao patrimônio pode validamente integrar a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Segundo o procurador, o STJ realmente permitiu a retirada da inflação da tributação, mas nos anos de inflação elevada. Naqueles casos, a inflação era retirada por meio da correção monetária das demonstrações financeiras. De acordo com a PGFN, essa correção eliminava distorções tanto nas receitas como nas despesas.

Com o processo de desindexação e estabilização da economia, iniciado pelo Plano Real, a Lei nº 9.249, de 1995, proibiu a correção monetária de demonstrações financeiras, tanto para fins fiscais como societários. Desde a mudança, há outros julgados favoráveis à Fazenda Nacional (REsp 13851164).

“As empresas estão se movimentando”, afirma o advogado Daniel Ávila Thiers Vieira, do Locatelli Advogados, sobre a procura das companhias pela tese em 2019. A discussão é antiga, mas com a mudança no cenário de juros, para Selic mais baixa, o assunto começou a interessar mais, acrescenta o advogado.

Ele explica que, pela tese, a recomposição inflacionária não configura ganho patrimonial e, por isso, não estaria sujeita à tributação pelo IRPJ e pela CSLL. “Não é assim que a Receita entende. Ela cobra sobre tudo”, diz.

O advogado Breno Ferreira Martins Vasconcelos, do escritório Mannrich Vasconcelos, entende que a tese é juridicamente consistente, embora ainda não esteja consolidada desfavoravelmente à Fazenda Nacional. Segundo ele, embora a incidência de IRPJ e CSLL sobre a correção monetária das aplicações financeiras não tenha sido amplamente analisada pela jurisprudência, o assunto envolve racional semelhante ao da discussão sobre a tributação do lucro inflacionário das demonstrações financeiras.

Há no STJ (1ª e 2ª turmas) diversos acórdãos favoráveis sobre a antiga discussão. “Embora ambas [as teses] falem de inflação, é um pouco diferente”, reconhece o advogado Luís Augusto da Silva Gomes, do escritório Viseu Advogados.

“A tese em si [não tributação dos efeitos inflacionários] ainda está em curso”, reforça o advogado Diego Miguita, do escritório Vaz, Buranello, Shingaki & Oioli. Segundo ele, uma decisão do STF em outra tese poderá dar um norte sobre o tema. Os ministros vão definir se incide IRPJ e CSLL na correção pela Selic dos pedidos de devolução de valores pagos a mais por contribuintes (repetições de indébito). Não há previsão de quando o processo será julgado.

Fonte: Valor Econômico

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