Vamos tratar, neste artigo, de atividades exercidas em nome individual, quer somente por pessoa física ou pelo empresário individual, titular da empresa. Não vamos tratar de outras formas de atuação, que também são equiparadas à pessoa jurídica (sociedade em conta de participação, exploração de empreendimentos imobiliários, por ex.)
A questão se torna mais relevante nos dias atuais, já que é muito comum o exercício de inúmeras atividades em nome individual, por meio de uma sociedade unipessoal de responsabilidade limitada.
Neste ponto é importante trazer como pano de fundo o Art. 966 do CC – Código Civil Brasileiro, que define empresário como aquele que exerce de maneira profissional, com habitualidade e interesse de lucro atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços. O Código Civil não considera empresário quem exerce uma profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda que utilize do trabalho de auxiliares ou colaboradores, exceto se a forma de exercício da profissão constituir elemento de empresa (§ único, do Art. 966, do CC).
Portanto, a linha divisória entre exercer a atividade como pessoa física ou na forma de empresário individual (pessoa jurídica) é estabelecer inicialmente algumas perguntas. Primeira, na execução da atividade comercial ou de prestação de serviços pretendida estarão presentes os elementos de empresa? Os principais indicadores da presença de elementos de empresa são: contratação de empregados auxiliares; organização da atividade por meio de hierarquia no quadro de empregados; a prestação de serviços não pode ser feita exclusivamente por meio de trabalho pessoal do titular. Deve haver o concurso de outros profissionais auxiliares. Os investimentos em máquinas, equipamentos e instalações devem ter o fito de lucro na atividade econômica a ser desenvolvida. Assim, havendo elementos de empresa na atividade pretendida, a forma de constituição será na condição de empresário individual e não como pessoa física. Segunda, o objeto da prestação de serviços é próprio de uma atividade de profissão regulamentada? (médico, engenheiro, contador, advogado, economista, etc.). Neste caso, a princípio, a atividade não pode ser constituída na condição de empresário, como pessoa jurídica, exceto se o seu exercício configurar a presença de elementos de empresa.
Uma boa prática complementar a indicar a presença de elementos de empresa é a existência de investimentos regulares e contínuos em campanhas de marketing, por ex., que se revelam necessários para difundir a marca, prospectar clientes, afirmar-se em um nicho de negócio, etc.; aplicação de técnicas de administração no empreendimento; operação por meio de organograma funcional para os empregados. Todos estes elementos dão o caráter empresarial para a atividade, o que permite pleitear o registro de constituição na Junta Comercial ou em Cartório, na condição de empresário individual ou sociedade unipessoal limitada, diferenciando-se claramente da atividade desenvolvida por pessoa física. Só para reforço de compreensão: havendo a presença de elementos de empresa na atividade e sendo esta comercial, o ato de constituição deve ser registrado na Junta Comercial, mas, sendo prestação de serviços, com a presença intrínseca, regular e contínua de elementos de empresa, o registro deve ser feito em Cartório, como pessoa jurídica.
Como lei tributária, o Art. 162 do RIR/2018 diz:
Art. 162. As empresas individuais são equiparadas às pessoas jurídicas (Decreto-Lei nº 1.706, de 23 de outubro de 1979, art. 2º).
§ 1º São empresas individuais:
I – os empresários constituídos na forma estabelecida no art. 966 ao art. 969 da Lei nº 10.406, de 2002 – Código Civil;
II – as pessoas físicas que, em nome individual, explorem, habitual e profissionalmente, qualquer atividade econômica de natureza civil ou comercial, com o fim especulativo de lucro, por meio da venda a terceiros de bens ou serviços (Lei nº 4.506, de 1964, art. 41, § 1º, alínea “b”; e Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 27, § 1º); e
III – as pessoas físicas que promovam a incorporação de prédios em condomínio ou loteamento de terrenos, nos termos estabelecidos na Seção II deste Capítulo (Decreto-Lei nº 1.381, de 23 de dezembro de 1974, art. 1º e art. 3º,caput,inciso III). (grifamos).
O § 2º do mesmo Art. 162 do RIR/2018 estabelece que não se aplica a equiparação à pessoa jurídica as pessoas físicas, que individualmente, exerçam as profissões ou explorem as atividades de: (I) médico, engenheiro, advogado, dentista, veterinário, professor, economista, contador, jornalista, pintor, escritor, escultor e de outras que lhes possam assemelhar; (II) profissões, ocupações e prestação de serviços não comerciais; (III) agentes, representantes e outras pessoas sem vínculo empregatícios que não pratiquem atos de comércio por conta própria (representantes comerciais, por ex.); (IV) serventuários da Justiça, como tabeliães, notários, oficiais públicos, entre outros; (V) corretores, leiloeiros e despachantes, seus prepostos e adjuntos; (VI) exploração individual de contrato de empreitada unicamente de trabalho pessoal e (VII) exploração de obras artísticas, didáticas, científicas, urbanísticas, projetos técnicos de construção, instalações ou de equipamentos, desde que explorados diretamente pelo autor ou criador.
Assim, por exemplo, se um dentista presta serviço pessoal, de forma individual, assumindo pessoalmente a responsabilidade profissional, mesmo que tenha uma auxiliar de instrumentação, por ex., a atividade não se equipara a pessoa jurídica, devendo neste caso, ser explorada como pessoa física.
Determinada pessoa física que execute, individualmente, contratos de empreitada exclusivamente de mão de obra (por ex., na construção civil), sem o fornecimento de material e sem o concurso de profissionais especializados, deve se constituir-se e prestar o serviço também como pessoa física, por não se equiparar à pessoa jurídica.
Esta compreensão é de extrema relevância, pois o desenvolvimento de algumas atividades por pessoas físicas, que por determinação legal, sejam equiparadas às pessoas jurídicas, estarão obrigadas a adotar todos os procedimentos contábeis, fiscais e tributários aplicáveis às demais pessoas jurídicas, em especial a: (a) inscrever-se no CNPJ; (b) manter escrituração fiscal e contábil, segundo a legislação de regência aplicável; (c) manter sob sua guarda e responsabilidade todos os documentos que comprovem as atividades desenvolvidas e pelos prazos previstos na legislação; (d) apresentar regularmente as declarações eletrônicas, de acordo com a atividade econômica exercida e porte do empreendimento (DCTF, Sped contábil, Sped fiscal, Sped PIS/Cofins, DASN, etc.) e (e) efetuar as retenções e recolhimentos dos impostos na fonte (IRRF, ISS tomador, dentre outros).
Vale destacar que mesmo que a pessoa física, caracterizada como empresa individual, não esteja regularmente inscrita no CNPJ, no órgão competente do registro civil (Cartório) ou de comércio (Junta Comercial), a condição é totalmente irrelevante para fins de enquadramento fiscal e pagamento do IRPJ.
Em suma, estes são os principais requisitos para a constituição de uma pessoa jurídica para a exploração individual da atividade econômica pretendida. Porém, caso a atividade não se enquadre como pessoa jurídica pelas razões acima, a recomendação é para que se opere, registre, controle os resultados, apure e recolha os tributos como pessoa física. Um enquadramento equivocado da atividade como pessoa jurídica pode levar o fisco a total descaracterização da personalidade jurídica e cobrar todos os tributos como pessoa física do seu titular, com os efeitos cruéis para o contribuinte.
Artigo escrito por José Homero Adabo – Contador e Vice-Presidente Administrativo do Sescon Campinas
por Sescon Campinas